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Moreira Campos - Porta de Academia

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Estava em Recife, onde me demorei quinze dias, quando soube do falecimento do dileto amigo Raimundo Girão, imensa perda para todos nós, para este Ceará da inteligência e das letras. Diria mais: da bondade, da compreensão, do cavalheirismo, da amizade, do amplo e profundo conhecimento histórico, que sob este último aspecto, pelos dias que correm, ninguém o excedeu entre nós. Conhecia o bastante sobre este chão: terra e homem. Fonte inesgotável e honesta para dirimir nossas dúvidas. Portador da mais profunda cearensidade, bastará a sua afirmação de que o Ceará é o Estado mais legítimo, mais autêntico, deste país Nordestino. Acrescente-se o seu amor, a sua afeição, a esta cidade nossa de Fortaleza, que tão bem dirigiu como Prefeito e a quem sempre serviu nos vários postos de relevo que ocupou. Quanto a Fortaleza, leiam-se, no caso, os seus livros "Geografia Estética de Fortaleza", "A Cidade do Pajeú", "Fortaleza e a Crônica Histórica", "A Princesa Vestida de Baile".

Memorialista ("Palestina, uma Agulha a as Saudades", já em 2ª edição), economista, estudioso do vernáculo, particularmente historiador, deixou mais de quarenta obras, sendo de destacar como uma de suas últimas e notáveis contribuições, já em avançada idade, o "Dicionário da Literatura Cearense", em parceria com Maria da Conceição Sousa, amiga igualmente querida e incansável pesquisadora.

Admirador de Alencar, por sinal, patrono de sua Cadeira na Academia Cearense de Letras, sobre "o pai do romance brasileiro", pelo sentido de brasilidade, deixou-nos ainda Raimundo Girão, em criterioso trabalho de pesquisa, registros sobre a nossa flora e fauna na obra do criador de "Iracema". Enriquece igualmente a sua bibliografia o "Vocabulário Popular Cearense".

Um polígrafo, portanto, com vocação de origem pela história, como já assinalei. Bem sei que ainda acalentava projetos, não obstante a idade de oitenta e sete anos com que morreu, tal a sua fortaleza de espírito.

Pranteio aqui o homem de letras e o amigo leal, honesto, empreendedor, lúcido que sempre foi.

Uma grande perda para os valores maiores da nossa terra e uma saudade a mais para todos nós.

(O Povo, ed. de 06.08.1988)

Moreira Campos. Renomado contista, foi professor e pró-reitor da UFC. Membro do Grupo Clã e da Academia Cearense de Letras.